sábado, 3 de agosto de 2013

Atleta amputado cria próteses para prática de esporte

Quando Oscar Pistorius, o atleta sul-africano que teve as duas pernas amputadas, disputa corridas com suas próteses, um determinado morador de Mendocino, Califórnia, acompanha o resultado com especial interesse. Van Phillips, 54, ele mesmo um paciente de amputação que costuma correr ao longo da costa dessa cidadezinha 240 quilômetros ao norte de San Francisco, inventou e usa a prótese Cheetah, um pé artificial que conquistou atenção e causou controvérsia em todo o mundo, ao ser usado por Pistorius em seu esforço para concorrer com atletas desprovidos de suas limitações físicas, em Pequim.

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"Seria a coisa mais emocionante que já me aconteceu, porque o pé artificial em formato de C foi o primeiro que eu imaginei", conta Phillips, sobre o conceito que ele introduziu em 1984. Em janeiro, o comando do atletismo mundial decidiu que as próteses de Pistorius lhe conferiam vantagem desleal diante dos demais atletas, e que por isso ele não poderia participar da Olimpíada. Pistorius apelou, e a Corte de Arbitragem Esportiva reverteu a decisão, alegando que o exame do equipamento de Pistorius pelas autoridades do atletismo havia sido incorreto.

Ele teria chances, ainda que remotas, de obter tempo que o qualifique para competir em Pequim, mas admite que treinar para competir na Olimpíada de Londres, em 2012, parece uma meta mais realizável. "O Cheetah pode ser mais vantajoso do que um pé humano", disse Phillips. "O carbono-grafite pode ser mais eficiente em termos de energia". Mas ele disse que em sua opinião Pistorius deveria ser autorizado a competir.
Segundo Phillips, outros fatores estão envolvidos: coordenação, simetria, a conexão entre o pé prostético e a perna do atleta, a flexibilidade limitada que os amputados têm nos joelhos e a maneira pela qual ele parte da posição de largada. É muito difícil, se não impossível, quantificar essa direção. "Talvez não exista uma resposta", disse Phillips.
Em 1976, quando Phillips tinha 21 anos, sua perna esquerda foi decepada abaixo do joelho em um acidente de esqui aquático. No hospital, suas medidas foram tiradas para uma prótese de madeira e borracha, e ele teve alta e foi mandado para casa. Phillips, um homem que sempre se dedicou ao atletismo, disse que sentia ter recebido "uma sentença ao inferno".

Por isso, criar uma prótese de perna melhorada passou a ser sua obsessão. Quando estudou no Centro de Próteses e Ortótica da Escola de Medicina da Universidade Northwestern, os professores o desencorajaram a desafiar as práticas dominantes. Ele descobriu que a indústria de próteses pouco havia avançado desde a Segunda Guerra Mundial e a guerra da Coréia.
A maioria das peças eram criadas para fins cosméticos ¿ uma prótese de pé com aparência semelhante à de um pé humano. Não havia preocupação com a geração de energia capaz de propelir a perna. Tomando de empréstimo conceitos surgidos no salto com vara, a mola de um trampolim e a forma de uma espada chinesa que seu pai tinha, Phillips imaginou uma prótese que permitisse que ele saltasse e se equilibrasse ao voltar ao chão.
O resultado foi o Flex-Foot, com diversos modelos diferentes destinados a pessoas com distintas condições de amputação. O Cheetah, um dos modelos, era destinado a atletas de elite. Contratado pelo Centro de Design Biomédico da Universidade do Utah, Phillips trabalhava nos finais de semana para criar uma prótese de uso diário que lhe permitisse correr, com o uso de carbono-grafite, um material mais forte que o aço e mais leve que o alumínio.

Um dia depois que Phillips conseguiu cruzar os corredores da universidade correndo, usando sua invenção, ele pediu demissão, encontrou sócios e fundou uma empresa, transformando o porão de sua casa em laboratório. Ele produzia pernas artificiais, testava até que quebrassem e refinava os modelos. Em dois anos, foram mais de 100 pernas.
Ele diz que terminou por compreender o erro dos demais projetistas de próteses: o esforço de replicar os ossos humanos. "Não é possível que nada funcione sem uma fonte de energia", disse Phillips. Ele estudou os ligamentos que armazenam energia muscular, observando os tendões de botos, cangurus e leopardos, e percebeu como as pernas traseiras dos leopardos se comprimiam ao final dos saltos do animal, e a natureza elásticas que elas apresentavam.
Sua empresa, a Flex-Foot, começou a vender próteses baseadas em seus modelos em 1984. Os primeiros projetos de Phillips eram para um pé em forma de J, com calcanhar. Pelo final dos anos 80, ele havia criado o Cheetah, em forma de C e sem calcanhar.

Em 2000, ele vendeu sua empresa à Ossur, uma fabricante de próteses sediada na Islândia, que continua a vender o Cheetah e outros modelos criados por Phillips. Jon Sigurdsson, o presidente-executivo do grupo, definiu Phillips como "um visionário, cujas idéias e técnicas progressistas continuam a ocupar posição central em nosso legado".
Em sua casa, em Mendocino, uma cidadezinha ao estilo da Nova Inglaterra localizada à beira do Pacífico, Phillips ainda projeta para ele mesmo ¿ próteses para esqui, surfe e mergulho (o pé é removido e uma nadadeira afixada ao soquete). E como sua filha de oito anos adora cavalgar, ele pretende criar uma prótese para uso em hipismo.
Phillips também está trabalhando no projeto de uma prótese de pé firme mas flexível para vítimas de minas. O maior obstáculo, ele diz, é a imaginação do paciente de amputação. Muitos deles não conseguem acreditar que será possível caminhar com facilidade ou correr de novo ¿ até que são apresentados a Phillips ou qualquer dos usuários de seus projetos.

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